O Estado do Maranhão localiza-se em uma posição de transição entre três macrorregiões brasileiras: Nordeste, Norte e Centro-Oeste, com feições fitogeográficas e climatológicas características daquelas regiões. Pertencente à região da Amazônia oriental, abriga a fronteira da floresta tropical úmida, áreas de caatinga, regiões de cerrado, campos inundáveis, região litorânea com campos de dunas e paleodunas, bancos de areia, restingas e mangues, e áreas de transição entre esses ecótonos.
O Maranhão, foi incorporado em 1955 à Amazônia Brasileira, através da lei nº 1806 de 6 de janeiro de 1953, reconhecendo-se assim como parte importantíssima do Bioma da Amazônia, com 34% do seu território incluído dentro desta área. A denominação de Pré – Amazônia Maranhense passa a existir na década de 1960, com a institucionalização da Amazônia Legal, quando o estado fundamentado em aspectos geofísicos e econômicos reúne a parte oriental do Maranhão à Amazônia. (ARAÚJO, 2010, p. 43,)
Geograficamente a região Oeste do Maranhão se caracteriza por apresentar aspectos biofísicos de dois biomas totalmente distintos: Cerrado e Floresta Tropical, dessa forma, seu perfil é definido como "Zona de Transição”.
A região oeste do estado ou tocantina, como é comumente designada teve como umas das correntes migratórias os nordestinos que vieram em busca de terras úmidas, e incorporaram seus modos de vida, mas também aprenderam com os maranhenses, formas de produção da pequena agricultura, que se baseava no sistema tradicional tendo como algumas de suas características o conhecimento e cultura dos habitantes locais, a priorização de mão de obra direta, intinerância de cultivos e a fertilidade do solo estabelecida por algum esterco animal, nutrientes das cinzas e vegetação em decomposição.
Com a promulgação da Lei 2.979/69, conhecida por Lei Sarney de Terras, as fronteiras agrícolas do Estado foram abertas para grandes grupos da Agroindústria e da pecuária e fechadas para a pequena produção, contrariando o projeto de colonização da SUDENE que considerava o Maranhão como estado solução para a seca do Nordeste (ARAÚJO, 2010, p.43)
De um prisma sócio-econômico, a Região Tocantina apresenta nuances históricos marcados por conflitos sociais, sobretudo no que tange à questão fundiária, devido ao nível acentuado de concentração de terras. A década de noventa registrou os maiores índices de violência no campo, por outro lado no mesmo período, foi registrado uma expansão de mobilizações de segmentos camponeses que resultou em ocupações de terra, como forma de pressão para a implementação de uma política de reforma agrária no estado.
Observa-se ainda que nos últimos 20 anos, houve uma expansão da agricultura de exportação, materializada nos grandes projetos e (do chamado) agronegócio, gerando um processo de especulação do valor da terra, e uma disputa entre agricultores familiares, fazendeiros, empresas nacionais e transnacionais. Tudo isso resultou em forte pressão sobre a estrutura socioeconômica, cultural e, principalmente ambiental, na região oeste do Maranhão que sofreu uma transformação da paisagem original própria da pré Amazônia.
Os impactos são relacionados à questão fundiária e ao acesso e formas de uso de determinados recursos naturais explorados economicamente pelas comunidades rurais espalhadas na região oeste do estado, provocando o êxodo das famílias de agricultores familiares para os centros urbanos mais próximos, que não apresentam condições de absorver o crescente contingente humano.
Dessa forma, os maiores investimentos em infraestrutura e financiamentos se dão no setor primário, com destaque à soja, eucalipto, cana de açúcar e pecuária, para a implantação de grandes áreas de monocultura associadas à formação de grandes complexos agroindustriais, conforme demonstra Mesquita (2008, p.38)
As grandes empresas capitalistas se apropriaram de milhões de hectares através do acesso à terra pública subsidiada. Essa ação ocorreu, inicialmente, rumo à região central do estado (mearim) e mais tarde (segundo momento) no sentido centro-oeste para as microrregiões do Pindaré e de Imperatriz.
Neste contexto, a pequena produção tendeu a perder seus espaços produtivos frente à expansão dos latifúndios e empreendimentos, que vislumbram em seu planejamento a implantação da monocultura e a devastação ambiental e humana. Tais investimentos desconsideram a necessidade de acesso dos agricultores familiares aos recursos naturais necessários à manutenção de sua economia.
Ao longo do tempo, observa-se que os agricultores familiares no Maranhão ainda permanecem cultivando a terra na forma do sistema tradicional de derruba e queima. Esta forma de produção aliada à herança de terras já degradadas por pastagem oriundas do latifúndio contribui de maneira significativa para a exaustão dos recursos naturais e da sua biodiversidade.
Em resposta a expansão do agronegócio, alguns grupos de agricultores familiares da região oeste do Maranhão passaram a investir em sistemas agroflorestais, como alternativa concreta para uma forma de produção que respeitasse o ser humano e o meio ambiente. Tal perspectiva econômico-produtiva aposta nos benefícios que trazem estes sistemas, como a melhoria da utilização do solo, a reversão dos processos de degradação dos recursos produtivos, o aumento da disponibilidade de madeira, de alimentos e de serviços ambientais. Adicionalmente a esses aspectos, a introdução do componente florestal no sistema constitui-se em alternativa de geração de trabalho e aumento da renda rural. Essas experiências surgiram na região na década de 90 com o estímulo das organizações sociais e sindicais ligadas aos agricultores familiares no estado. Os referidos agricultores passaram por diversos momentos históricos que foram desde a conquista da terra até organização da produção.
Apesar do reconhecimento por setores da academia ou das organizações representativas da sociedade civil, dos benefícios desses sistemas agroflorestais, o seu conhecimento e uso ainda são limitados. Grande parte das experiências encontra-se desconectada; caracterizando-se como iniciativas isoladas uma das outras, o que reduz potencial e possibilidades, pois necessitam de acompanhamento e estímulo em diversos âmbitos para o desenvolvimento de maiores ações de pesquisa, para a verificação dos benefícios ambientais e incentivos econômicos que venham a estimular sua implantação.
No Maranhão, essas experiências têm sido mais exploradas pelo saber prático dos agricultores familiares, havendo, portanto, uma enorme lacuna a ser preenchida pela pesquisa científica, que indubitavelmente se confirmará em importante ferramenta para assegurar a sustentabilidade dos sistemas agroflorestais, a equidade social e a proteção ambiental.
O processo de ocupação amazônica passou por diferentes etapas relacionadas com os interesses econômicos que nortearam o desenvolvimento naquela região. Nos anos 60 com o início do regime militar, a Amazônia brasileira passa a ser concebida como fronteira para a expansão agropecuária extensiva, alicerçada nos incentivos fiscais ofertados pelo governo, através do instrumento do FINAM, gerido pela Superintendência da Amazônia-SUDAM. Com a abertura de novos territórios, os povos da região amazônica foram marginalizados e impelidos a se deslocarem para áreas inacessíveis, ao mesmo tempo em que as terras cultivadas sob regime de itinerância, degradavam com a redução dos ciclos de descanso. A agricultura praticada pelos povos que habitam a região amazônica faz parte de sua cultura e tem como principais características a itinerância, o uso do fogo e o pousio florestal. Entretanto apesar de sua importância na economia regional, devido à pressão exercida pelo modelo de desenvolvimento hegemônico e seu pacote tecnológico – a monocultura –, sua continuidade está ameaçada e faz-se necessário uma readaptação para a nova realidade que se configura. A agricultura tradicional que tem como matriz tecnológica a roça no toco, encontra-se com sua sustentabilidade econômica e ecológica comprometida, à proporção que vem sendo praticada sem a disponibilidade de terras e sem longos períodos de pousio para recomposição florestal. Com a redução de suas terras, os agricultores familiares foram obrigados a reduzir o tempo de capoeira, o que dificulta a recuperação da fertilidade do solo, tendo como conseqüência safras cada vez menos produtivas e um meio ambiente mais degradado. Conforme analisa Carneiro (2008) em meados dos anos 1970 inicia-se no Maranhão a etapa dos grandes projetos, trazendo peculiaridades como a forte presença do estado na sua viabilização por meio de financiamento da agricultura de exportação e a concentração de grandes áreas de terra.
Em contraponto ao modelo de desenvolvimento largamente difundido pelo estado, a agricultura praticada pelos povos da Pré - Amazônia Maranhense está associada diretamente à produção agroecológica, tendo como oportunidade os sistemas agroflorestais, nos quais os agricultores desenvolvem suas atividades de forma diversificada.
A partir de minhas observações durante meu percurso profissional desenvolvido em conjunto com agricultores da região oeste do Maranhão, afirmo preliminarmente que esse modelo de agricultura realiza um conjunto de atividades econômicas que não exclui nem aplicação de tecnologias nem a transformação e agregação de valor aos produtos. Envolve atividades agropastoris, extrativistas e silviculturais, atingindo não só os processos produtivos, mas também os de transformação (beneficiamento) e comercialização.
Os sistemas agroflorestais são um demonstrativo das estratégias e ferramentas de desenvolvimento das práticas agroecológicas, utilizadas pelos agricultores que vêm contribuindo para o resgate de costumes tradicionais e da cultura local. Podem ser definidos como uma forma de uso da terra na qual se juntam cultivos permanentes (espécies frutíferas e/ou madeireiras) com cultivos anuais e/ou criações de animais, de forma simultânea ou em seqüência temporal e que interagem econômica e ecologicamente.
Ao investir nos sistemas agroflorestais os agricultores familiares almejavam construir propostas e caminhos de desenvolvimento que considerassem as dimensões do ser humano, numa relação de amor e respeito ao meio ambiente, tendo como ponto central a defesa incondicional da vida. Nessa perspectiva esses agricultores buscaram caminhos produtivos alinhados com os conceitos e práticas agroecológicas.
O Fundo de Investimentos da Amazônia-FINAM criado pelo Decreto Lei nº 1.376, de 12.12.74, foi instituído com o objetivo de garantir os recursos necessários à implantação de projetos contemplados pela extinta SUDAM. A Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia foi criada na época da ditadura no período do governo de Castelo Branco em 1966, com a finalidade de promover o modelo desenvolvimentista gestado pelo Estado para a região amazônica, gerando incentivos fiscais e financeiros especiais para atrair investidores privados, nacionais e internacionais. “São os povos que aderem a uma tecnologia e a práticas semelhantes às que vigoravam tradicionalmente e que não são lesivas ao meio ambiente” Disponível em: <http://www.ispn.org.br/entrevista-com-manuela-carneiro-da-cunha/> acesso em: 20 de outubro de 2010. Sistema de agricultura tradicional baseada nas seguintes operações: derrubada-queimada-cultivo-e-pousio.
ARAÚJO, Helciane de Fátima Abreu. Memória, Mediação e Campesinato:As representações de uma liderança sobre as lutas camponesas da Pré-Amazônia Maranhense. Manaus: UEA Edições, 2010.
ALMEIDA, Rogério Henrique. Araguaia – Tocantins: fios de uma história camponesa. Fórum Carajás, São Luís, 2006.
PICOLI, Fiorelo. O capital e a devastação da Amazônia. 1. ed. São Paulo: Expressão Popular, 2006.
GONÇALVES, Carlos Walter Porto. Amazônia, Amazônias. São Paulo: Contexto, 2001.
NUNES, Sidemar Presotto ; CARNEIRO, Marcelo Sampaio. Agricultura Familiar da Soja na Região Sul e o Monocultivo da Soja no Maranhão: duas faces do cultivo da soja no Maranhão. 1. ed. Rio de Janeiro: Fase, 2008.
Disponível em: <http://www.ispn.org.br/entrevista-com-manuela-carneiro-da-cunha/> acesso em: 20 de outubro de 2010